IPCA-E e a JUSTIÇA DO TRABALHO

A incógnita sobre a constitucionalidade ou não do novo índice


O IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial), criado em dezembro de 1991, é divulgado trimestralmente pelo IBGE desde janeiro de 1995, como previsto na Medida Provisória 812, de 1994 (convertida na Lei 8.981/1995).

Em que pese seja possível encontrar publicações acerca da variação mensal de referido índice, sua validade e aplicabilidade é trimestral.

Para a sua composição é considerada a variação dos gastos da população (cujos rendimentos variem entre 1 e 40 salários mínimos) em determinados setores de consumo, como o de bebidas, alimentação, habitação, saúde, transportes, vestuário, educação etc.i

Até o início do ano de 2015, em que pese algumas manifestações contrárias à aplicação da TRD (Taxa Referencial Diária), era pacificada a sua aplicação para a correção monetária dos débitos trabalhistas, como previsto no art. 39, da Lei 8.177/91, e inclusive referendado pela OJ 300, da SDI-1/TST.

OJ-SDI1-300 EXECUÇÃO TRABALHISTA. CORREÇÃO MO-NETÁRIA. JUROS. LEI Nº 8.177/91, ART. 39, E LEI Nº 10.192/01, ART. 15 (nova redação) – DJ 20.04.2005

Não viola norma constitucional (art. 5°, II e XXXVI) a determinação de aplicação da TRD, como fator de correção monetária dos débitos trabalhistas, cumulada com juros de mora, previstos no artigo 39 da Lei nº 8.177/91 e convalidado pelo artigo 15 da Lei nº 10.192/01.

Contudo, após os julgamentos da Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs nº 4357, 4372, 4400 e 4425) pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que consideraram inconstitucional a expressão “índice oficial da remuneração básica da caderneta de poupança”, do parágrafo 12, do artigo 100 da Constituição Federal, com a consequente inaplicabilidade da TRD, iniciou-se uma movimentação para que referido índice também deixasse de ser considerado na Justiça do Trabalho.

Em agosto de 2015, provocado pela Reclamação Trabalhista 0000479-60.2011.5.04.0231, o Pleno do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em decisão unânime, seguiu precedente do STF e, por arrastamento (por atração, consequência), considerou inconstitucional a expressão “equivalente à TRD”, do art. 39, da Lei 8.177/91, entendendo, consequentemente, pela aplicação do IPCA-E à correção monetária dos débitos trabalhistas.

Além destas definições, o Pleno também decidiu pela modulação dos efeitos de decisão, entendendo que passariam a valer, para os processos ainda não quitados, a partir de 30 de junho de 2009, mesma data da entrada em vigor do dispositivo declarado inconstitucional pelo STF (artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, introduzido pela Lei 11.960/2009).

Referida decisão alarmou todos os interessados, inclusive alguns deles requereram ingresso à ação, no intuito de defender seus interesses, de seus associados etc.

A Fenaban (Federação Nacional dos Bancos), na tentativa de manter o entendimento acerca da aplicação da TRD para os débitos trabalhistas, apresentou Reclamação Constitucional (RCL) ao STF, numerada como 22.012, em clara manifestação contrária à decisão do Tribunal Superior do Trabalho, que entendeu pela aplicação do IPCA-E.

Com a reclamação, a Fenaban conseguiu, mediante liminar deferida pelo ministro Dias Tofolli, suspender os efeitos da decisão proferida em agosto de 2015, afastando, ao menos provisoriamente, a aplicabilidade do novo índice.

Neste ínterim, após nova decisão, o TST reconsiderou os efeitos da primeira modulação, e definiu que o IPCA-E passaria a valer a partir de março de 2015, no mesmo sentido do disposto na ADI 4357, julgada pelo STF.

Em 05 de dezembro de 2017, durante o julgamento de mérito da RCL 22.012, a Segunda Turma do STF, de forma majoritária, julgou a reclamação improcedente, sob o argumento de que a decisão proferida pelo TST não configurava desrespeito ao julgamento do STF nas ADIs 4357 e 4425, tornando, então, válida a decisão proferida pelo TST na RT 0000479-60.2011.5.04.0231.ii

Enquanto este momento não chegar, a expectativa de alguns especialistas é de que este impasse continue sendo resolvido caso a caso. O que certamente criará um cenário de insegurança jurídica, fato que não é novidade ao tratar-se da justiça do trabalho. O que se lamenta.

Para embolar ainda mais a discussão, recentemente a Anamatra ajuizou Ação de Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6.021) contra o § 7º, do art. 879, da CLT, requerendo, subsequentemente, a definição do IPCA-E, ou INPC, como índice oficial da justiça do trabalho.

Na contramão disto, a Consif (Confederação Nacional do Sistema Financeiro), propôs ação inversa, a Ação Direta de Constitucionalidade (ADC 58), requerendo ao STF que declare a constitucionalidade deste mesmo artigo, buscando com isso a efetividade da aplicação da TR.

Em nenhuma destas ações há decisões proferidas, nem em sede de liminar, no entanto, essas movimentações fortalecem o entendimento de que o presente assunto está longe de seu desfecho final.

No entanto, em que pese as incertezas que permeiam o assunto, recomenda-se que as empresas, que via de regra são o polo passivo das reclamações trabalhistas, se preparem e conheçam o seu passivo trabalhista considerando os dois índices de atualização (TR e IPCA-E), evitando surpresas futuras, ante este cenário de instabilidade.


i https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/precos/ipcae/textoesp.shtm

ii http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=363914

iii https://www.valor.com.br/legislacao/5669399/tst-determina-aplicacao-do-ipca-e-para-correcao-de-condenacoes

iv CLT, art. 879, § 7º: A atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial será feita pela Taxa Referencial (TR), divulgada pelo Banco Central do Brasil, conforme a Lei no 8.177, de 1o de março de 1991.

v https://www.valor.com.br/legislacao/5370317/turmas-do-tst-aplicam-o-ipca-e-para-correcao-de-condenacoes

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*Wildner Pancheri, sócio no AMBF Advogados, especialista em Direito e Processo do Trabalho pela COGEAE – PUC/SP.

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